Em toda enfermidade, quanto antes se inicia o tratamento dela, melhor. Por vezes, tal celeridade é decisiva para evitar que o paciente sofra de modo desnecessário. Além de assegurar a recuperação e efetiva reabilitação do enfermo. Tais fatos são especialmente verdadeiros para doenças graves com desenvolvimento letal, como o câncer. Dessa forma, é bastante válido proporcionar a maior quantidade de garantias possível para o paciente portador de tal doença dar entrada no tratamento. Nesse sentido, uma iniciativa bastante louvável é a Lei Federal nº 12.732/12, sancionada em 22 de novembro de 2012, que entrou em vigor a partir de maio de 2013, conhecida como “Lei dos 60 dias”.
Entendendo a lei
A lei dos 60 dias garante que pacientes têm o direito de realizar o primeiro tratamento em até 60 dias após o diagnóstico no SUS.
O prazo começa a partir da expedição do laudo que atesta a doença e se encerra no dia do primeiro tratamento. Isto é, quando se executa uma cirurgia ou a primeira sessão de radioterapia ou quimioterapia, conforme a demanda do caso em questão. Dessa forma, a lei vale para todos os tipos de câncer. A exceção é a do câncer de pele não melanótico dos tipos basocelular ou espinocelular, do câncer de tireoide sem fatores clínicos pré-operatórios de alto risco, bem como os casos sem indicação de tratamento cirúrgico, radioterápico ou quimioterápico, e nessa situação, o paciente é encaminhado para cuidados paliativos.
Existem outras leis similares a essa?
Apesar do grande avanço humanitário que a lei dos 60 dias representa, outros aspectos conexos ao processo de tratamento dos diversos tipos de câncer devem ser levados em consideração. Nesse sentido, outras iniciativas foram tomadas posteriormente, e mais leis foram aprovadas. Entre elas, temos a Lei nº 13.896/2019, conhecida como “Lei dos 30 dias”. Ela determina que, caso um paciente esteja com suspeita de câncer, os exames que podem atestar o diagnóstico devem ser realizados em no máximo 30 dias desde a sua requisição. A lei foi sancionada em outubro de 2019 e entrou em vigor a partir do dia 28 de abril de 2020.
Uma outra lei é a 14.450, de 2021, que garante o acompanhamento das suspeitas de confirmações de câncer de mama, com abordagem personalizada de cada paciente para orientar e agilizar o diagnóstico e o tratamento da doença.
Quando a lei não é respeitada
Apesar da lei ser de suma importância para os pacientes oncológicos, é necessário que ela seja cumprida o mais perfeitamente possível. Infelizmente, esse nem sempre é o caso. Segundo dados do Radar do Câncer, apenas 50% dos pacientes diagnosticados com câncer em 2018 tiveram seus tratamentos iniciados com 60 dias ou menos. Neste ano, 280 mil novos casos foram registrados. Dessa forma, vemos que existem ainda alguns empecilhos para que haja o cumprimento e atuação de tão relevante lei para os brasileiros. Portanto, faz-se necessário entender como proceder quando a lei não é observada.
Quando o paciente não dá início ao tratamento dentro do prazo estipulado por lei, ele deve procurar a Secretaria de Saúde do seu município. É importante informar a existência dessa dificuldade e requerendo o início do tratamento, comunicando os tratamentos e remédios de que ele precisa. Para embasar o pedido, pode-se incluir os laudos ou as receitas médicas a ele entregues. É importante salientar que, pelo descumprimento da lei, os gestores envolvidos no atraso podem responder judicialmente. As penalidades cabíveis, são expressas no artigo 3º da Lei 12.732/12.
Alternativas
Se este requerimento não for efetivo, recomenda-se o contato com a ouvidoria do SUS, seja pelo número 136 ou pelo site http://portalsaude.gov.br, para registrar a reclamação na Ouvidoria Geral do SUS. E se esse recurso também não for efetivo, o paciente tem o direito de recorrer à Justiça. Indica-se, por exemplo, que o paciente busque a Defensoria Pública, o Ministério Público Estadual ou a Procuradoria da República de sua região, caso precise de assistência gratuita.
Uma outra possibilidade é recorrer a um advogado particular. Nesse âmbito jurídico, pode-se ajuizar uma ação judicial para o cumprimento da já citada Lei dos 60 Dias por intermédio do Sistema dos Juizados Especiais da Fazenda Pública. Esse órgão tem a competência para julgar processos contra os governos estadual e municipal até o limite de 60 salários-mínimos. Um sistema parecido acontece com os Juizados Especiais Federais com respeito à União.
Entre os assuntos dos quais esse juizado trata, temos todas aquelas associadas ao cumprimento da lei dos 60 dias. Pode-se recorrer aos Juizados Especiais de modo gratuito, sem necessidade de contratar um advogado. Dessa forma, para acionar a justiça, faz-se necessário reunir alguns documentos; entre eles, RG, CPF, comprovante de residência, cartão dos SUS, laudo do exame patológico e o relatório médico.
Nesse último documento, deve-se constar a identificação da doença, a especificação da CID, descrição do tratamento indicado, ressaltando a posologia e o tempo de uso do medicamento; o grau de urgência do tratamento e, se necessário, a justificativa da ineficiência dos fármacos comumente fornecidos na rede pública de saúde, a fim de embasar a justificativa de um tratamento de saúde distinto daquele comumente oferecido.
Âmbito político
Além disso, em um âmbito político, é importante conhecer os possíveis gargalos que impedem o perfeito cumprimento da lei, a fim de mitigar essas dificuldades e melhorar a qualidade de vida dos pacientes.
Um deles é o monitoramento dos casos ao longo do território brasileiro. Nos casos específicos dos cânceres de colo de útero e de mama, o SISCAN (Sistema de Informação do Câncer) é a plataforma do SUS responsável pelo registro dos casos destes tipos de câncer.
Por fim, esse sistema não é utilizado em todos os municípios brasileiros, e naqueles em que ele funciona, os profissionais do serviço público de saúde relataram, em pesquisa realizada pela FEMAMA (Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama), que as principais dificuldades para implementar-se eficientemente o sistema estão relacionadas, muitas vezes, com a falta de treinamento dos profissionais, diversidade de trabalhadores que prestem suporte para o sistema e falta de verbas dedicadas à implementação da ferramenta.
Referências:
http://www.oncoguia.org.br/conteudo/lei-dos-60-dias/4287/15/